STJ consolida natureza mercantil das stock options e reduz incertezas para empresas

STJ consolida natureza mercantil das stock options e reduz incertezas para empresas

STJ define que stock options têm natureza mercantil, trazendo segurança jurídica e beneficiando startups e empresas. Por Cristiane Secco e Manitou Lobato

A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acerca do Tema nº 1.226, que determinou que as stock options possuem natureza mercantil e não remuneratória, representa um marco importante para o ambiente corporativo brasileiro. O tribunal afastou a tributação imediata das opções de compra de ações, protegendo empresas e colaboradores de uma interpretação mais severa da Receita Federal, que tratava essas operações como parte da remuneração dos funcionários. Essa distinção traz previsibilidade e segurança jurídica, especialmente para startups, que utilizam esse instrumento como estratégia fundamental para atrair e reter talentos.

Por muitos anos, a falta de clareza jurídica em relação à natureza das stock options gerou insegurança e controvérsias judiciais. Empresas que ofereciam esse benefício corriam o risco de serem tributadas com base na hipótese de que as opções eram parte da remuneração, o que teria impactos significativos sobre a estrutura de custos dessas organizações. A decisão do STJ, ao classificar as stock options como de natureza mercantil, alinha-se com a lógica de que esse tipo de benefício não representa, imediatamente, um ganho patrimonial, que depende do negócio, envolve riscos e não ocorre diretamente em função do trabalho desempenhado pelo colaborador.

Esse entendimento reflete a modernização das práticas empresariais e a evolução do mercado corporativo, onde o alinhamento entre os interesses dos colaboradores e das empresas se tornou fundamental. As stock options permitem que funcionários se beneficiem diretamente do crescimento e da valorização da empresa, criando uma relação de incentivo mútuo. A decisão do STJ reforça essa dinâmica, afastando a tributação até o momento em que ocorra o ganho de capital, ou seja, na venda das ações, garantindo que o colaborador só pague tributos quando realmente obtiver retorno financeiro.

O julgamento no STJ ocorreu com base na sistemática de recursos repetitivos, o que significa que a decisão tem efeito vinculante para todos os tribunais e órgãos administrativos — com exceção do Supremo Tribunal Federal (STF). Esse aspecto da decisão é particularmente importante, pois encerra as discussões sobre o tema no âmbito do Judiciário e estabelece um precedente claro e aplicável em escala nacional. Para o setor corporativo, especialmente para empresas de tecnologia e startups, essa segurança jurídica é essencial para o planejamento e a expansão dos negócios.

Um dos pontos centrais do debate foi a interpretação do artigo 43 do Código Tributário Nacional (CTN), que trata da tributação sobre acréscimos patrimoniais. O STJ, ao afastar a aplicação desse artigo às stock options, reafirmou que, até o exercício da opção de compra, não há acréscimo patrimonial concreto. O tribunal seguiu o entendimento de que as opções de compra de ações são um instrumento de natureza mercantil, alinhando-se a decisões anteriores do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e do Ministério Público, que também adotaram essa visão.

A relevância dessa decisão vai além da simples definição tributária. Ela impacta diretamente a capacidade das empresas brasileiras de competir em um mercado global, onde as stock options são amplamente utilizadas como mecanismo de incentivo. Em muitos casos, a utilização das stock options é uma das poucas alternativas viáveis para empresas em fase inicial, que podem não ter a capacidade financeira de oferecer salários competitivos, mas que podem atrair talentos oferecendo uma participação futura no sucesso da empresa.

Entretanto, é importante observar que, embora a decisão traga alívio ao mercado, ainda há espaço para discussões adicionais, especialmente no que diz respeito a possíveis esclarecimentos solicitados pela Fazenda Nacional, que pode apresentar Embargos de Declaração ao STJ. O tema, entretanto, dificilmente será levado ao STF, já que o próprio Supremo, no julgamento do Agravo Interno no Recurso Extraordinário nº 1.436.593, entendeu que a matéria sobre a natureza das stock options é infraconstitucional, cabendo ao STJ a palavra final.

Para as mais de 500 ações em curso que discutem a incidência de Imposto de Renda sobre as stock options, a decisão do STJ representará um marco. As empresas que aguardavam um posicionamento definitivo agora podem retomar suas estratégias com mais segurança, sabendo que não serão surpreendidas por tributações inesperadas.

O mercado de startups, em especial, será o grande beneficiado por essa clareza jurídica. Startups dependem de agilidade e flexibilidade para competir em mercados altamente dinâmicos, e a possibilidade de oferecer stock options sem o risco de penalidades fiscais desproporcionais fortalece esse modelo de negócio. A decisão também evita que o uso de stock options como ferramenta de incentivo seja desvirtuado, transformando-se em um passivo fiscal oneroso.

Em conclusão, a decisão do STJ sobre as stock options não apenas resolve uma questão tributária complexa, mas também sinaliza um avanço na forma como o Judiciário brasileiro interpreta as novas práticas empresariais. O alinhamento entre a legislação e as demandas modernas do mercado é crucial para garantir um ambiente de negócios saudável e competitivo. Ao consolidar a natureza mercantil das stock options, o STJ cria as bases para que as empresas possam continuar inovando e crescendo, com a segurança de que estão agindo em conformidade com a legislação e as melhores práticas internacionais.

Cristiane Secco é Chief Legal Officer para Assuntos Corporativos e de Negócios do Albuquerque Melo Advogados

Manitou Lobato é advogado do escritório Albuquerque Melo nas áreas de Direito Societário e Contratos. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

 

Publicado por Monitor Mercantil