Prevenir é mais barato do que litigar: o segredo que muitas empresas ignoram

Prevenir é mais barato do que litigar: o segredo que muitas empresas ignoram

Não é novidade que o Brasil ocupa o topo do ranking global de litigiosidade. Somos um dos países – senão o mais – litigante do mundo.

Os Tribunais do Brasil vivem assoberbados e convivem, diariamente, com milhares de processos, o que, além de contribuir para a morosidade do sistema, prejudica o julgamento de demandas que de fato requerem a atenção e a intervenção do Estado e muitos deles nascem de falhas que poderiam ser resolvidas antes mesmo de bater à porta do Judiciário.

Isso se dá, em grande parte, pela ausência de investimento em políticas preventivas pelas empresas, de modo que, na grande maioria das vezes, o litígio é fruto de falhas que poderiam ter sido resolvidas antes da discussão bater na porta do judiciário. A pergunta que precisa ser feita com urgência dentro das empresas é: o que elas têm feito antes do processo judicial ser instaurado?

É na resposta que se percebe um padrão: pouco, ou nenhum investimento em canais extrajudiciais, uma cultura interna voltada apenas ao “contencioso” e um distanciamento perigoso entre o jurídico das empresas e as demais áreas que lidam diretamente com o consumidor. O resultado, infelizmente, é previsível: ações em massa, custos crescentes com a judicialização e impactos que vão muito além das condenações financeiras.

É comum encontrar quem acredite que atuar na prevenção de litígios é, além de custoso, ineficaz, pois tem em si a ideia arraigada de que a cultura do brasileiro é litigar. No entanto, essa é uma visão ultrapassada, que ignora os dados e a experiência prática de quem atua diariamente na base dos conflitos.

O consumidor brasileiro, em sua grande maioria, procura canais de atendimento antes de ingressar com um processo judicial. Portanto, investir em uma estrutura que responda adequadamente a canais extrajudiciais como Procon, Consumidor.gov.br, e até o Reclame Aqui – que é uma plataforma privada, mas de grande notoriedade – , não é apenas uma boa prática, mas sim uma estratégia concreta de contenção de passivo e proteção da reputação e imagem de uma empresa.

Um processo judicial, além de custoso e moroso, pode impactar no abalo de imagem da marca, o que por si só já prejudica negócios. Já uma boa resposta administrativa, através de canais estruturados e efetivos, ainda que com eventual concessão ao consumidor, custa menos, resolve mais rápido e preserva as relações. Fazendo com que, além de tudo, se fidelize aquele consumidor à marca.

Atuar preventivamente exige mais do que um jurídico proativo: exige uma mudança cultural. O jurídico deve estar conectado com atendimento, ouvidoria, produto e até mesmo com o marketing. É preciso compreender as falhas, para poder propor melhorias e trazer o jurídico para dentro da operação.

Em muitos casos, cabe ao advogado que atua com prevenção de litígios educar o consumidor. Já em outros, ele pode moderar expectativas e restaurar a relação de confiança do consumidor com a marca. Mais do que um solucionador de processos, o advogado se torna um promotor de eficiência, reputação e ESG e, como consequência, traz efetividade e celeridade na resolução dos conflitos, evitando gastos desnecessários

Prevenir litígios é escutar, resolver e entregar valor de forma transparente e ética. Isso reverbera não apenas nos indicadores financeiros, mas na percepção do mercado, dos consumidores e até dos investidores perante a marca.

Empresas que adotam uma postura proativa na prevenção são mais eficientes, mais respeitadas e menos expostas.

O tempo em que o jurídico só atuava depois da citação ficou para trás. O futuro exige ações de prevenção, antes da instauração do litígio. Estratégia antes da demanda, relações antes do confronto.

Empresas que ainda não têm uma estrutura voltada à prevenção de litígios precisam repensar a estratégia. A economia não está apenas na redução do número de processos judiciais, mas em todos os esforços, impactos, conflitos e desgastes que se deixou de ter com o investimento em políticas preventivas efetivas, tempestivas e conclusivas.

Julia Vieira de Castro Lins é Chief Legal Officer do Albuquerque Melo Advogados, pós-graduada em Direito Empresarial pela FGV e integrante das comissões Direito Civil, de Direito Aeronáutico, Espacial e Aeroportuário e de Direito Empresarial da OAB/RJ; Renata Belmonte é sócia do Albuquerque Melo Advogados na área de Contencioso Cível, pós-graduada em Processo Civil pela Escola Paulista de Direito (EPD) e com curso de especialização em Direito Civil pela Universidade de Coimbra, membro da Comissão Permanente de Defesa do Consumidor, da Comissão Especial de Direito Bancário e da Comissão Especial de Direito Aeronáutico da OAB-SP e da Comissão de Direito do Consumidor da OAB/RJ.

Fonte: Lex Legal Brasil