Brasil e a IA: protagonistas ainda não, mas o palco está montado

Brasil e a IA: protagonistas ainda não, mas o palco está montado

Por Danielle Braga Monteiro

A inteligência artificial está redesenhando a economia global. E, embora o Brasil tenha avançado com atraso, os sinais de que o país começa a se mover com mais estratégia e articulação são cada vez mais evidentes. Por muito tempo, assistimos à revolução tecnológica de fora do palco principal — com encantamento, inércia e pouca adoção prática. Mas esse enredo começa a mudar.

Em 2025, o Brasil integrou um estudo internacional robusto sobre o uso de IA nas empresas, conduzido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Boston Consulting Group e INSEAD (sigla em francês para Instituto Europeu de Administração de Empresas). O recorte nacional analisou 167 empresas do estado de São Paulo, com foco nos setores de manufatura e tecnologia da informação — seguindo a mesma segmentação aplicada aos países do G7.

Os dados trazem um cenário revelador. A IA já não é vista como promessa distante: ela está no centro da estratégia de muitas empresas. Ainda assim, os desafios permanecem concretos — estruturar dados, atrair talentos, medir retorno. O que diferencia quem avança parece claro: conexão com o ecossistema certo e apoio técnico bem direcionado.

Ou seja, a adoção no Brasil já começou. Ainda tímida, mas em movimento.

Enquanto São Paulo se firma como campo de testes e aplicação prática da IA, o Rio de Janeiro aposta em um modelo urbano integrado de inovação, com infraestrutura e visibilidade internacional.
A cidade, que abriga o Web Summit Rio — maior evento de inovação da América Latina, com presença garantida até 2030 —, anunciou recentemente o projeto Rio AI City, com a ambição de se tornar o maior hub de data centers da América Latina e um dos dez maiores do mundo.

Mais do que um projeto tecnológico, trata-se de um reposicionamento estratégico. O Rio quer se tornar uma plataforma global para IA, computação em nuvem e processamento de dados em larga escala. Mas o plano vai além da infraestrutura: envolve requalificação urbana, áreas verdes, centros culturais, residências e espaços para startups. Um ecossistema que conecta vida urbana, sustentabilidade e inovação tecnológica.

O Rio se posiciona, assim, não apenas como base técnica da IA, mas como um laboratório vivo de como a tecnologia pode transformar cidades e modos de viver.

E esse movimento não se limita ao nível local. Recentemente, o governo federal anunciou que vai antecipar os efeitos da reforma tributária para atrair investimentos bilionários em data centers, mirando empresas como Amazon e Nvidia. A proposta prevê até R$ 2 trilhões em aportes, colocando o Brasil na disputa global por infraestrutura de IA, cloud e processamento de alto desempenho.

É um passo relevante: sinaliza que o país começa a agir com visão estratégica, alinhando incentivos econômicos, política industrial e ambição tecnológica.

O que começa a se desenhar é um cenário mais promissor e distribuído: São Paulo como campo de maturidade empresarial; o Rio como vitrine e centro de infraestrutura crítica para a nova economia.
E, à medida que as empresas ganham tração com tecnologia, cresce também a importância de uma base jurídica bem estruturada — contratos inteligentes, regras claras sobre dados e algoritmos, e modelos de responsabilidade adaptados à nova realidade.

Quando o jurídico entra como parceiro estratégico, a inovação tende a avançar com mais confiança, escala e impacto.

O Brasil, aos poucos, sai da posição de espectador e entra em campo. Ainda não somos líderes, mas já deixamos de ser coadjuvantes.

Para que essa virada se consolide, alguns elementos são indispensáveis: diagnóstico contínuo, como o promovido pela OCDE; políticas públicas articuladas; formação conectada ao mercado; segurança jurídica para dados, contratos e algoritmos; e um recado direto: IA não é moda, é estratégia.

A inteligência artificial está redefinindo os rumos da economia, do trabalho e da política pública. O Brasil tem o talento, os dados e a demanda para construir uma agenda própria — com pragmatismo, ambição e colaboração entre setores.

O palco está pronto. Cabe a nós decidir como vamos atuar. O futuro da IA no Brasil depende de como escreveremos os próximos capítulos.

Fonte: Capital Digital