Perder um ente querido já é, por si só, um momento doloroso. Mas além da dor emocional, muitas famílias também precisam lidar com a burocracia e as questões financeiras que surgem após o falecimento.
E uma dúvida comum é: as dívidas deixadas por quem partiu passam para os herdeiros?
A resposta não é tão simples, mas entender as regras ajuda a evitar surpresas e permite que as famílias se preparem com antecedência.
O chamado planejamento sucessório, que envolve tanto a organização da herança quanto a destinação das pendências financeiras, é uma forma de cuidado e de proteção.
O primeiro passo: inventário
Segundo o Código de Processo Civil, quando alguém falece, os herdeiros têm até 60 dias para abrir o inventário. Esse processo formal serve para levantar todos os bens, dívidas e obrigações deixados, além de identificar credores, analisar testamentos e definir a divisão da herança.
O inventário pode ser demorado e custoso: envolve honorários advocatícios, taxas de cartório e o pagamento de impostos sobre a transmissão dos bens.
A advogada Tatiana Naumann, sócia da área de Família e Sucessões do AMelo, explica: “Com a morte, todo o patrimônio do falecido, que inclui suas dívidas, é reunido no espólio. Ou seja, bens, direitos e dívidas são reunidos conjuntamente para servir de base ao processo de inventário”.
O que acontece com as dívidas?
Ao contrário do que muitos acreditam, a maior parte das dívidas não desaparece com a morte. Segundo o Código Civil (Lei n 10.406), elas são quitadas com os recursos e bens deixados pelo falecido, nunca com o patrimônio pessoal dos herdeiros.
Tatiana reforça esse ponto:
Os herdeiros não respondem com o patrimônio pessoal pelas dívidas do espólio. As dívidas são pagas primeiramente e, o que sobrar, é partilhado entre os herdeiros. Caso não haja patrimônio suficiente para pagar todas as dívidas, não haverá partilha nem cobrança direta aos herdeiros, já que apenas o espólio responde por elas.”
Exemplos práticos:
- Se os bens superam as dívidas, elas são pagas e o restante é dividido entre os herdeiros.
- Se as dívidas são maiores que o patrimônio, todo o espólio é usado para quitá-las, e a herança fica zerada.
- Se não houver nenhum bem ou recurso, os herdeiros não são obrigados a pagar.
Vale lembrar que dívidas de caráter estritamente pessoal, como jogos ou gastos sem contrato formal, não passam adiante.
Como funciona a quitação, na prática?
Para saldar as pendências, podem ser usados diferentes caminhos:
- Venda de imóveis, veículos ou outros bens do falecido.
- Negociação com credores para reduzir ou parcelar dívidas.
- Pagamento proporcional, caso o patrimônio não seja suficiente.
- Renúncia à herança, caso os herdeiros prefiram não assumir a responsabilidade de administrar o espólio.
“As dívidas do falecido são pagas exclusivamente com os bens deixados por ele, dentro do limite do valor da herança. Em nenhuma hipótese os herdeiros são cobrados pelo valor remanescente que o espólio não consiga quitar.”, explica Tatiana.
Ordem de prioridade das dívidas
A legislação brasileira estabelece uma ordem de pagamento, segundo o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios:
- Dívidas trabalhistas (como salários de funcionários e cuidadores).
- Tributos (IR, IPTU, IPVA e outros).
- Dívidas sem garantia real (cartão de crédito, contas de consumo, cheque especial etc.).
E os financiamentos?
Em casos de empréstimos ou financiamentos, muitas vezes existe o chamado seguro prestamista, que quita o saldo devedor em caso de falecimento do contratante.
Essa é uma ferramenta importante de planejamento, já que evita que o patrimônio seja usado para pagar dívidas.
Custos do inventário
Mesmo quando não há dívidas, a família precisa arcar com custos significativos para concluir o inventário, segundo o Código De Processo Civil (Lei nº 13.105). Entre eles estão:
- Honorários advocatícios.
- Taxas de cartório.
- Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), que varia de 4% a 8% conforme o estado.
Como se planejar para evitar problemas?
Algumas medidas podem reduzir bastante os impactos financeiros para a família:
- Contratar seguros prestamistas em financiamentos e empréstimos.
- Fazer um seguro de vida, que garante liquidez imediata aos beneficiários e não entra no inventário.
- Doar bens em vida, aproveitando isenções de imposto para pequenos valores.
- Elaborar um testamento, para organizar a divisão dos bens de acordo com a lei e a vontade pessoal.
Um ato de cuidado
Ninguém gosta de pensar sobre a própria morte, mas organizar as finanças e planejar o futuro é também uma forma de amor e proteção à família.
Isso evita conflitos, reduz custos e garante que os herdeiros passem pelo luto com menos preocupações financeiras.
Fonte: Portal Viva